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sexta-feira, 23 de agosto de 2013

UM OLHAR PARA ALEM DO MENSALÃO - O QUE É E ONDE NASCEU O MENSALÃO?




UM OLHAR PARA ALEM DO MENSALÃO

O QUE É E ONDE NASCEU O MENSALÃO?

            Essa pergunta não é de fácil resposta, primeiro pelo simplismo com que a grande imprensa quase sempre imediatista e midiática poderia dizer “imediática” (termo novo), denominou de “Mensalão do PT”. Assim, é com essa nomenclatura que iremos abordar o assunto.  Foi dessa forma que o mensalão nasceu para a imprensa e assim para nós, cidadãos “pobres mortais” É desse mensalão que nos propomos a buscar sua origem, de como e onde nasceu.
            Como tudo na vida, quando se nasce, no princípio, é sempre algo pequeno, nada que pudesse imaginar, viesse a ser o monstro com o qual nos deparamos. Assim tal prática política não diferia em dada de outras tantas tão nefastas quão. Era bem reduzida, não passava de uma forma de estabelecer relações cordiais com o “inimigo politico” no pós-eleição, objetivando a governabilidade. Inicialmente ela se deu na esfera de acanhados municípios do interior do Brasil, principalmente o interior do Paraná, tendo em vista que nesses locais havia as condições necessárias que tal “doença social” se desenvolvesse da forma como iremos tratar na sequencia.
           Para melhor esclarecer, devemos tratar da origem e da amplitude desse termo “mensalão” que, como já afirmamos no início não passava de uma relação digamos de confraternização entre vencidos e vencedores em pleitos municipais para escolher “prefeitinhos” como o ex-senador Mão Santos costumava tratar seus correligionários lá do Piauí. Só que não é do Piauí e sim do Paraná os prefeitinhos que iremos abordar.
           Originariamente esta relação não era tratada ou vista como um esquema de corrupção e sim como uma prática saudável de se atingir a paz nos governos. Havia corrupção, mas havia também assédio moral, ‘bulling’ e perseguição política. Pois estamos tratando de algo que nasceu junto com a ditadura militar de 1964.
          O termo mensalão como já colocado, não seria o mais apropriado, porque, no início como até em outros exemplos que proliferam pelo país, não havia uma periodicidade determinada, muito menos mensal. O que havia e o que há é sim a compra de apoio político: um “cala boca”, tão conhecido dos políticos brasileiros, mas nada de mensal, ou mesmo anual. Eu prefiro denominar essa prática como: “compadrismo moderno”. Ou seja, a mesma prática usada pelos antigos coronéis da velha república para amansar seus correligionários mais afoitos.  “Só que agora, esse compadrismo tem outras variáveis e ganhou força como a constituição que estabeleceu à modernidade do “estado de welfare” cujo legado foi a ‘nova república”.
           O local onde nasceu esse novo rebento da política brasileira, não foi nas grandes metrópoles e nem nas cidades tradicionais do nordeste e do sudeste. Eu vi nascer o mensalão nos pequenos municípios do Paraná, cuja origem eram de recente processo de colonização iniciado nos anos cinquenta, por companhias inglesas do Norte do Paraná.
           Essas áreas recém-colonizadas viu nascerem rapidamente dezenas de novos municípios que começavam sua vida política juntamente com o novo ‘establishment’ ou seja, a “ditadura militar”. Imagine o quadro social ora vigente: Com a expulsão dos ocupantes da terra (caboclos paranaenses e índios), nas décadas anteriores,  cria-se um vazio demográfico de terras férteis. Aplica-se um modelo de colonização à inglesa, que não tinha nenhum interesse em manter a “cultura” ou religião dos expulsos e também dos que chegavam.  Assim,  se dá origem ao processo colonização.
          Chegavam aos milhares, na sua maioria homens rudes: agricultores, analfabetos, pessoas simples, que deixaram para traz suas crenças, assim chegadas de todos os rincões da nação se amalgamavam em torno de uma e única capela, depois igrejas católicas. Depois essa mesma leva de trabalhadores seriam novamente expulsos da terra, formando novas levas de migrantes que darão continuidade ao ciclo vicioso de implantação do capitalismo baseado no agronegócio. Bem esse era o quadro, uma região ainda, despolitizada com um caldo de cultura insignificante, formado por uma população de pessoas simples com o desejo de desbravar, progredir, construir um lar uma família, uma cidade.
           Para o fim a que se propunha o quadro político-social vigente não poderia ser melhor. As novas condições políticas vigentes a partir da implantação dos atos institucionais, por parte do governo central, principalmente o AI5, com o fim das liberdades democráticas, o fim dos direitos individuais do cidadão, isso não atrapalhava em nada o processo que ali se desenrolava, ao contrario era fator positivo. Afinal, ninguém queria briga política queria sim, plantar e colher, comprar e vender, ou seja, se dar bem na vida, brigas só as passionais e por embriagues nas vendas cobertas de poeira vermelha e cheirando aguardente.
         Por esse processo, a década de 60 viu centenas de municípios se formarem no Paraná, a de 70 viu esse modelo de governança crescer e se espalhar para outras regiões e outros estados. Assim, logo as assembleias estaduais passaram a dar suporte intelectual a essa prática cujo aprendizado se dera por migrantes que deixavam o Paraná partindo, principalmente para outras fronteiras agrícola e pecuária da região norte que  naquela época começavam a receber o bagaço do processo de colonização do sul. 
         Nas décadas seguintes esse “compadrismo moderno” já contaminava a política de boa parte dos estados a região norte, pois que iniciavam processo de colonização semelhante. Só que agora não mais sob tutela de empresas inglesas e sim dos militares, a chamada a “marcha para o oeste”, cujo lema: “uma terra sem homens para homens sem terra”. 
          O que ocorreu no Paraná foi à verdade um “laboratório político” de manter o poder, a custa da destruição do meio ambiente e da cujas consequências são visíveis hoje em toda república.  O que fomentava essa prática denominada aqui não mais de mensalão e sim de “compadrismo moderno”?  Posso afirmar que era  a “paz” do silêncio que apoiava aquele desenvolvimento “a qualquer custo”, cujo objetivo era por aquela bela floresta no chão e plantar café, algodão, cereais e criar gado. 
          As comunidades desenvolviam-se rapidamente o que demandava uma forma própria de fazer política, que seguindo a cartilha dos ditadores não questionassem o destino e o futuro se não daquelas populações, pelo menos da exuberante floresta subtropical existente e que sem piedade era destruído. Nessas regiões não existem matas ciliares ou reserva legal, tudo foi desmatado, o preço, ainda esta para ser pago.
          Bem o quadro político vigente era de um grupo do governo a ARENA, e outro do governo também chamado MDB. Os verdadeiros opositores do regime foram caçados, mortos ou expulsos do país. Imagine uma região onde não existe um caldo de cultura, não se tem tradição cultural, familiar e política, tudo conspirava para o nascimento do que viria a ser chamado “mensalão”. Com as eleições municipais, a cada quatro anos, o quadro era de partido e candidatura única, em sua maioria. Mas que democracia era essa que não tinham adversários. Passa-se a criar adversários fictícios, depois  gente vê como fica. Assim era comum despacharem candidatos a vereadores, os menos espertos para as legendas de “oposição”.  Na verdade não existia nenhum interesse por parte daqueles colonos principiantes da politica em ser da oposição, mas aconselhados pelos mais “espertos”. Diziam: Depois a gente senta e acerta a casa, de forma que ninguém se prejudique. Ninguém deles – é claro.
         Assim nas décadas de 60, 70, 80... Viu-se as coisas darem “certo para alguns”, e nas campanhas eleitorais repetiam-se as siglas Arena x MDB, depois PDS x PMDB, e assim por diante, até os dias de hoje  com PSDB x PT e PT X ninguém? A verdade é que pouca coisa mudou.
          Os acontecimentos que se seguiram foi que as maiorias dessas pessoas tiveram que entregar suas terras aos bancos, ou vende-las a quem tinha mais capital, devido a uma falta de política agrícola por parte dos governantes.  A miséria instalou-se, milhares de boias frias se formavam nas periferias após perderem suas terras os que conseguiram sair com algum dinheiro, foram para o norte do país reproduzir o laboratório do norte do Paraná. Nessa região de fato não havia oposição, como não existe até hoje. Pode ser de qualquer legenda,  nessa região terminadas as eleições o acerto entre as partes é sagrado, de forma que tudo volte a reinar na mais absoluta “paz silenciosa”.
           O que de fato acontecia: Ora toda eleição é desgastante, um candidato fala mal do outro, envolvem as famílias, acusações e maledicência de lá e de cá, ou seja, um vale tudo no palanque, mas política mesmo, nada. Agora, se ainda se perde a eleição, se fica dependendo da caridade do prefeito eleito, que deverá dar-lhe uma indenização, um “cala boca” e assim, os supostos opositores serram fileira junto com o grupo vencedor.    
           De forma que o “prefeitinho” eleito chama os adversários, perdedores ou não para uma conversa, na qual expressa sua vontade de pacificar a comunidade e governar “para todos”. Compromete-se a com ajuda financeira, àqueles que tiveram algum prejuízo, um emprego para a filha, nora ou amante no posto de saúde, outro cargo no gabinete, na Câmara, etc. e tal!  O objetivo era fazer que se acabassem as rivalidades “políticas”, que na verdade nem eram políticas e sim pessoais, já que a verdadeira política estava banida.  Todos deveriam se comprometer com a governança do eleito.
          É claro, a compra de votos, o favorecimento e outras práticas espúrias da política também faziam parte, só que isso sempre houve e não era uma exclusividade dos prefeitinhos, mas isso de estabelecer uma governança nos moldes do compadrismo e como a ditadura exigia só quem sabia fazer e bem como exclusividade da região, digamos o ‘modus operandi’ da nossa “democracia”. Isso era o diferencial, eliminar através da corrupção qualquer tipo de ameaça à paz.
          A verdade é que não havia oposição, os partidos de oposição eram de fachada para encobrir a ideologia de estrema direita que reinava sob o domínio dos velhos políticos matreiros, capachos dos militares e executados pelos “prefeitinhos do Paraná”. Assim, viu-se o modelo político  nesses grotões criarem vida própria se estabeleceram em toda a república, seja nos parlamentos estaduais e federais assim como em todas as esferas do executivo.
           Agora, porque afirmar eu tal prática nasceu daí?  
Como afirmado os tempos já são outros a modernidade já se instalara no país.
No Nordeste isso não seria possível em virtude das antigas e também funesta práticas de guerras familiares ou de clãs para obter ou permanecer no poder. No sul, tais condições não imperavam, e tais práticas eram abominadas pelos que estavam chegando de certa forma expulsos de seu torrão de origem em virtude delas. Portanto não se admitiam rivalidades, por isso era necessário se estabelecer a paz. 
         No Paraná essa prática foi tão difundida que virou ‘modus operandi’ consolidando-se sem que houvesse denúncias. Já em Rondônia o Mensalão fez água e veio a público embora a imprensa nunca quisesse de fado apurar a origem de tal ferramental de governança. Assim isso que os senhores denominam mensalão não é exclusividade de uma pessoa ou partido, é uma prática que hoje esta enraizada em todas as prefeituras do Brasil, com maior ou menor intensidade, pois se não: quem não quer a paz politica no seu município?
              Porque me propus a elaborar tais conceitos?
Ora, há muito vejo na imprensa virulenta, querendo colocar o Sr. José Dirceu como o bode expiatório da história o mensalão. Não sei se ele esteve envolvido em tais práticas. Para quem conhece sua trajetória política fica difícil acreditar no que a imprensa diz, ser ele o criador do mensalão. Como eu sei que ele conhece a realidade de que tratei, pois viveu nessa região.
             Quando do golpe militar, foi contra esse modelo de governança estabelecido por esses fantoches da ditadura que não sabem o que é uma democracia. Assim José Dirceu preferiu ingressar na luta contra o regime, a ser um prefeitinho da ditadura. Foi preso, banido e retornou clandestinamente ao país.  È claro que o José Dirceu conhece e viveu de perto esse laboratório e talvez tenha mesmo feito uso de argumentações semelhantes, pois infelizmente ainda é a política rasteira que impera. Por isso penso que não é admissível atribuir a culpa exclusiva a ele pela criação do monstro, de forma a  mais uma vez livrar os verdadeiros algozes: os golpistas de então, políticos e militares.
            É claro que a justiça deve apurar e julgar sem com isenção. O que me refiro é que vivemos numa sociedade pluralista e, portanto, nem todos os dedos da mão são iguais. O que acho simplória por parte de parte da imprensa e de alguns intelectuais saudosos desse período é tentar colocar o José Dirceu e o PT como criadores dessa aberração política. Que de certa forma produziu certa paz silenciosa em toda a nação, levando ao que conhecemos como “o milagre brasileiro”, portanto teve lá suas compensações, mas o que não conhecemos ainda é o custo desse modelo. Pois só aquele que não faz da política o instrumento para atingir objetivos particulares e pessoais sabe que não existe mais de uma ética, a única é a ética civilizatória, capaz de transpassar o tempo.
            A conclusão mais dura a que se chega é: ainda esta para se colher a safra do que se plantou nos anos de exceção. Infelizmente á ética da política brasileira foi violentada nesse período e está ainda carente de pessoas capazes de construir uma governança sem precisar coagir, difamar, comprar e perseguir. Essa seria a ética civilizatória capaz de construir a verdadeira paz, não silenciosa e sim barulhenta, necessária a uma boa governança.


Edição ideiaquilvicenda
  

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